quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Conquistas da Marcha

Marcha conquista IV Conferência de Saúde Mental e retoma a urgência do fim das torturas

Tendo reunido 2300 pessoas na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, com música, dança, bonecos, cartazes e faixas defendendo as formas de tratamento que substituem o velho manicômio e permitem o convívio social aos portadores de transtorno mental, a Marcha dos Usuários pela Reforma Psiquiátrica Antimanicomial fez acontecer o que parecia improvável: pessoas chamadas loucas, inválidas, com histórias de internações, vieram a Brasília e foram recebidas pelo Planalto, em dez audiências em ministérios, na Câmara e no Senado.

De invisíveis, como bem apontou Gilberto Carvalho, chefe do gabinete pessoal do presidente da República que recebeu 35 manifestantes, os usuários da saúde mental conquistaram lugar de cidadãos. Foram ouvidos, o governo deliberou com eles. Marcharam organizadamente, apresentaram pautas precisas, conhecedores que são da situação real das políticas públicas a eles destinadas – ou das que precisam ser criadas, como é o caso das relacionadas à subsistência, renda e economia solidária.

A vitória imediata da Marcha foi o compromisso com a realização da IV Conferência Nacional de Saúde Mental ainda nesse governo, assumido por Gilberto Carvalho com anuência do presidente Lula. Carvalho mostrou-se sensível às denúncias de mortes e torturas em hospitais psiquiátricos. Eles ainda recebem metade da verba da saúde mental, proveniente do Sistema Único de Saúde, sem que recuperem os pacientes internados, como de fato fazem os serviços abertos como os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), quando estão estruturados e em funcionamento.

Sobre a persistência de tortura e maus tratos, Carvalho se disse “assustado” com o que ouviu e assumiu a tarefa de colocar o tema para o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, responsável pela implementação da Reforma Antimanicomial. Paulo Vannuchi, secretário especial de Direitos Humanos, ressaltou que a tortura se alimenta da impunidade e se comprometeu a estruturar o tratamento do tema na secretaria, em diálogo, sobretudo, com o Ministério da Saúde.

Com relatos vivos, a marcha conseguiu colocar na pauta do governo federal a necessidade da Reforma Psiquiátrica, instituída por lei em 2001 pela Lei 10.126. Dossiê apresentado pelo Instituto Damião Ximenes, do Ceará, sobre o município de Ipueiras, trouxe imagens de pacientes encarcerados em celas, sem acompanhamento médico, psicológico ou condições de higiene. A cidade tem um Caps que recebe visita de psiquiatra três vezes ao mês, sem, portanto, ter estrutura profissional para atender nem mesmo os pacientes em tratamento.

Na audiência com a ministra interina da Saúde, Márcia Bassit, os manifestantes argumentaram que, ao pedirem celeridade para a Reforma, não tratam do tempo que querem, mas do tempo necessário par evitar mortes nos hospitais psiquiátricos. A implementação da reforma seria acelerada com o pleno funcionamento dos Caps; com a solução da constante falta de verbas para as atividades na ponta; qualificação dos profissionais; e abertura de Caps III, que realizam atendimento 24 horas.

Os usuários, cujas organizações são agregadas pela Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial, não têm dúvidas da importância dos diálogos sobre a defesa da Lei 10.216/91, sobre a necessidade do fim das interdições judiciais ou do desenvolvimento das políticas de assistência, como o Programa de Volta para Casa, que tem por objetivo reintegrar socialmente usuários que passaram por longas internações.

A estes temas somam-se o fim dos manicômios judiciários e o acesso ao tratamento de saúde mental, nos moldes da Lei 10.216, para portadores de sofrimento que estejam respondendo a processos ou cumpram penas. Todos os pontos foram pautas das audiências com os ministérios da Justiça, do Trabalho, Cultura, Desenvolvimento Social, INSS, Conselhos Nacionais de Secretarias Municipais de Saúde e de Secretários de Saúde, que também receberam a marcha e se propuseram a caminhar no esforço de incorporar a realidade da saúde mental em suas atividades.

Terminadas as audiências, os usuários, agora marcados pela experiência da possibilidade de ação coletiva, seguem presentes, atentos, sobretudo visíveis. Neste 10 de outubro, quando os países celebram o Dia Mundial da Saúde Mental, esperamos que o momento marcante de tomada de voz pelos usuários, no Brasil, marque a retomada do andamento da Reforma Psiquiátrica Antimanicomial.

Humberto Verona – Presidente do Conselho Federal de Psicologia
Nelma Melo – Coordenação da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial (Renila)
Texto publicado no Blog da Renial.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Marcha dos Usuários à Brasília

No dia 30 de setembro de 2009 ocorreu a Marcha dos Usuários a Brasília, e os partipantes do Núcleo e da Associação Franco Rotelli estiveram presentes.
Nossa comitiva de 22 pessoas, formada por técnicos e usuários dos serviços de saúde mental, saíram de Santos e se encontraram com a comitiva do ABC, em Santo André, seguindo então para Brasília.

Seguem as fotos dos principais momentos:











A Marcha conseguiu mobilizar conquistas pela saúde mental através das audiências e reuniões com os ministros e deputados, e por fim com o Secretário do Presidente, onde foi conquistada a 4a Conferência de Saúde Mental e a continuidade do programa "De Volta para Casa".
Na próxima 3a feira, dia 20, o programa Profissão Reporter mostrará a reportagem que fizeram neste evento. Confiram!

Abraços antimanicomiais!

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Marcha dos Usuários dos serviços de saúde mental à Brasília

http://marchadosusuarios.blogspot.com

REDE NACIONAL INTENÚCLEOS DA LUTA ANTIMANICOMIALMARCHA DOS USUÁRIOS À BRASÍLIA – POR UMA REFORMA PSIQUIÁTRICA ANTIMANICOMIAL.
Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial – RENILA, com apoio de diversas entidades, está organizando para o dia 30 de setembro de 2009, a Marcha dos Usuários à Brasília – Por uma Reforma Psiquiátrica Antimanicomial e conclama a todas as organizações, entidades e associações de usuários e familiares para se organizarem e Marchar rumo a Brasília.Neste momento, forças contrárias à Reforma Psiquiátrica Brasileira, em movimento organizado, utilizam os meios de comunicação de massa, numa verdadeira campanha para frear e desacreditar o Sistema Único de Saúde – SUS e nossas conquistas da Luta Antimanicomial.Nesses meios de comunicação são ouvidas autoridades e profissionais “doutores na matéria”. Casos mal sucedidos são pinçados e apresentados como regra, fragilizando o trabalho desenvolvido e influenciando negativamente a opinião pública, contra os avanços da Reforma Psiquiátrica.A voz do usuário nunca aparece. Suas entidades não são procuradas pelos jornalistas e suas opiniões não são consideradas. Chega de covardia! Chega de manipulação da informação. Os usuários dos Serviços de Saúde Mental exigem que suas opiniões sejam levadas em consideraçãoOs usuários durante anos, foram vítimas do abandono e da violência das internações psiquiátricas em hospitais asilares ou modernizados. São eles quem pode dizer o que querem. São eles, os que hoje frequentam os Serviços Substitutivos e que tem sua cidadania e inclusão social potencializada, é quem pode dizer que a Reforma Psiquiátrica Brasileira se constitui num patrimônio técnico, ético e político, do qual não estão dispostos a abrir mão. São eles, os usuários e familiares da Luta Antimanicomial, a prova viva de que os loucos podem viver em sociedade e que podem ser tratados em liberdade e com cidadania. Exigimos que a voz do usuário seja ouvida!Por isso a RENILA convida para juntos chegarmos em Marcha rumo a Brasília, partindo de todo o Brasil, onde durante todo o dia participaremos de atividades político-cultural e mostraremos nossa Força.A Marcha é um espaço de visibilidade expressão política dos usuários de Saúde Mental e suas organizações junto ao Governo Federal e a sociedade, com a finalidade de: defender o SUS, a Lei 10.216/01, reivindicar a realização da IV Conferência Nacional de Saúde Mental, a Reforma Psiquiátrica Antimanicomial, evidenciar o protagonismo dos usuários e fortalecer a Organização Política dos Usuários.Vamos organizar caravanas para que os verdadeiros protagonistas possam se apresentar em Brasília, de corpo presente, suas vozes e suas reivindicações, levando ao Presidente Lula e demais autoridades legislativas e judiciárias a disposição de luta em defesa de seus direitos.Se você quer ser ouvido e lutar por uma Reforma Psiquiátrica Antimanicomial, organize sua caravana! Ajude a construir essa Marcha!Informações pelos e-mail: marchadosusuarios@gmail.com ou "Deusdet: deusdetm@gmail.com "Vera Lúcia": vlmento@yahoo.com.brAssociação Chico Inácio (AM)Associação. dos Usuários dos Serviços de Saúde Mental de João Monlevade (MG)Associação dos Usuários dos Serviços de Saúde Mental de Minas Gerais (MG)Associação dos Usuários dos Serviços de Saúde Mental do Estado de Goiás (GO)Associação Verde Esperança (MG)Associação Loucos por Você (MG)Fórum Cearense da Luta Antimanicomial (CE)Fórum Gaúcho de Saúde Mental (RS)Fórum Goiano de Saúde Mental (GO)Fórum Mineiro de Saúde Mental (MG)Instituto Damião Ximenes (CE)Movimento dos Usuários dos Serviços de Saúde Mental da Bahia (BA)Movimento Pró-Saúde Mental do Distrito Federal (DF)Núcleo Antimanicomial do Pará (PA)Núcleo da Luta Antimanicomial da Paraíba (PB)Núcleo de Estudos pela Superação do Manicômio (BA)Núcleo Estadual de Saúde Mental (AL)Núcleo Estadual do Movimento da Luta Antimanicomial (RN)Núcleo Libertando Subjetividades (PE)Núcleo Por Uma Sociedade Sem Manicômios (SP)

terça-feira, 14 de julho de 2009

Reportagem


Ex-internos da ''casa dos horrores'' relatam a vida depois do hospício
Interdição no Anchieta, em 1989, iniciou reforma psiquiátrica, mas SP ainda tem 6.349 vivendo em hospitais




Adriana Carranca


Duas décadas após a intervenção na Casa de Saúde Anchieta, em 1989, marco inicial da reforma psiquiátrica no Brasil, há ainda 6.349 pacientes "de longa permanência" internados em São Paulo - 77,6% deles há mais de dez anos. Somente duas das 58 instituições no Estado não têm residentes. Em alguns casos, eles vivem isolados e sob o olhar de vigias. Segundo dados do último censo da Secretaria de Estado da Saúde, há registros de exploração de mão de obra gratuita, velada como atividade psicossocial. Do total, 70% são analfabetos.

Ex-internos do Anchieta, Hercílio, João e José conhecem bem essa realidade. Localizados pelo Estado, eles lembram a experiência no manicômio conhecido como "casa dos horrores", há 20 anos, e contam como vivem desde então.



MENTE PARADA

"Treze anos, foi? Treze?", repete, como em tudo, Hercílio Santos Trindade, de 48 anos, 13 deles marcados por alta medicação e uma sequência de choques que o fizeram perder a noção do tempo vivido na Casa de Saúde Anchieta. Hercílio põe as mãos na cabeça e faz com a boca um chiado estridente, tentando mostrar como eram as sessões. "Eu tinha pra mim que não dói, não dói, não... Era bom, bom pra acalmar." E solta uma frase com estranha lucidez: "A mente parada pensa em tudo."

O motivo da internação, aos 19 anos: uso abusivo de maconha. O pai, rígido, dava surras que o faziam desmaiar. Quando a mãe o flagrou com droga e ameaçou contar ao pai, ele a agrediu e acabou internado. Em seu prontuário, constam anotações como "paciente há três anos sem visita" e "com alta, mas família não o aceitou".

"Foi complicado o processo de volta, mas depois vi esse pai chorar abraçado ao filho, dizendo que não o deixaria mais", lembra o arte-educador Renato Di Renzo, que deu início à intervenção no Anchieta. "No hospício, Hercílio era um homem embrutecido." Bem diferente de Tim Maia, como é chamado hoje por amigos da usina de reciclagem onde trabalha, dado seu tamanho e vozeirão.

Após a morte do pai, Hercílio construiu, com verba do Programa De Volta para Casa, quarto e banheiro no quintal da irmã e passou a se cuidar sozinho. "Seis e meia estou de pé, tomo um cafezinho, fumo um cigarrinho, pego o 108 (ônibus) até o terminal, depois o 105 e, pra voltar, o 55", diz, com surpreendente clareza. "Amanhã é dia de remédio", quando vai a um dos Núcleos de Apoio Psicossocial (Naps), que substituem o atendimento no hospício, para uma injeção mensal. "Primeiro a mente, primeiramente...", filosofa.

Com trajetória semelhante, João da Paixão, de 46 anos, há 2 vive com Janete de Jesus, que tem transtornos dissociativos. Um ajuda o outro no apartamento de um cômodo que alugam com parte dos R$ 600 ganhos, cada um, na usina de reciclagem. A cooperativa tem apoio da Seção de Reabilitação Psicossocial (Serp) da Prefeitura de Santos e mantém 180 pacientes em projetos de geração de renda. "O foco não pode ser a loucura, mas o homem, sua saúde geral, sociabilidade, trabalho, vida", diz a chefe do Serp, Maria Maura Porto Ferreira.

João levanta às 4h, faz café e esquenta o pão. Quando Janete sai do banho, está tudo quentinho na mesa, junto às flores. Como a saúde dele é melhor do que a dela, ele controla os remédios de ambos. Há um mês, Janete teve um surto. "Com a minha experiência, eu já sei quando vai acontecer e como cuidar dela", diz João. Após oito dias, Janete recuperava o equilíbrio, diferentemente de internações anteriores, a primeira de seis meses, a segunda, de dois. "No Anchieta? Lá a gente vivia mesmo era amarrado", diz João.

José Gonçalo, cantor e compositor que atende pelo nome artístico de Jacaré Gularstone, nos recebe com seu primeiro CD, Paz e Amor. Mas, antes de qualquer pergunta, desabafa: "Rico tem stress, pobre é louco esfarrapado. Entende?" E desenrola num fraseado lento a dureza de sua vida, desde as primeiras batucadas na carteira da escola, no Recife. Aos 25 anos, Jacaré foi diagnosticado com "transtorno delirante persistente" e internado.

"A gente até passava pelo médico, mas antes já tomava um sossega-leão (choque) para não dar trabalho. Eu achava que ia morrer lá dentro." Mas, quando se viu na rua, dois anos depois, ficou "desorientado" e quis voltar. A reintegração teve a ajuda de uma vizinha "quase mãe". Mesmo assim, vieram a depressão e um novo surto. "Foi aí que o doutor Sérgio Prior (psiquiatra do Naps) disse: ?Jacaré, a música!? E eu lembrei que podia ser artista."


Fez sucesso na Rádio Tam Tam, criada por Di Renzo e tocada por ex-internos, que fizeram mais de 300 shows no Brasil e foram parar no The New York Times. Sem apoio, a rádio está desativada. "Era loucura. Quando a gente chegava, perguntavam: cadê os loucos? Porque a imagem da loucura era de gente suja, babando", diz Di Renzo. Jacaré virou ativista da luta antimanicomial e manteve-se artista. Mostra a carteirinha da Ordem dos Músicos do Brasil e, com ela, batuca trechos de Borracha: "Borracha pra quê?/ a ditadura acabou/ vivemos democracia/ o povo quer liberdade/ dançando alegria".

Reportagem disponivel em:



segunda-feira, 29 de junho de 2009

A Loucura

Que loucura é esta, com a qual não se chega a lugar nenhum?
Como e onde a loucura está?
Por onde posso ser sadio e louco ao mesmo tempo?

Até que ponto somos loucos?
Os loucos são sadios, ou os sadios são loucos?
Por onde a loucura conhece a verdade plena?
Aonde e quando a loucura pode ser acreditada?

Qual a definição de loucura?
A loucura é mesmo uma loucura?
Ou a loucura é um tempo transitório?

Rodei por todos os cantos, e encontrei um louco varrido, mas ele
me dizia as coisas mais maravilhosas possiveis, e cheguei à
conclusão de que a loucura é um tempo temporário de
pensamento contrário à sociedade.

Autor: Luiz Fernando Barbosa

terça-feira, 2 de junho de 2009

17 de maio - 20 da intervenção na Casa de Saúde Anchieta


No dia 17 de maio de 2009 o núcleo "Por Uma Sociedade Sem Manicômiso", participante da RENILA, realizou ato público em comemoração aos 20 da intervenção na Casa de Saúde Anchieta, antigo hospital psiquiátrico que existia em Santos, SP.

O evento foi realizado em frente ao prédio onde era instalado o hospital, e atualmente algumas famílias fizeram sua residência. Após o fim das atividades, o prédio ficou abandonado, e para evitar que a população de rua tomasse conta, um dos moradores da vizinhança começou a cuidar do espaço. Com o tempo, pessoas começaram a pedir auxilio para moradia, e então espaços foram organizados dentro do prédio para este fim.

Contou com a participação de ex-internos do hospital, que contaram um pouco da experiência vivida na época. Histórias de agressões, eletrochoques e maus tratos foram relembradas. Funcionários do antigo hospital também estiveram presentes, contando sobre a luta que travaram para atuarem de maneira a humanizar o atendimento.



Foram oferecidas atividades artísticas, como pintura em guache e montagem de ikebana, e os atuais moradores do espaço também participaram destas atividades.


Foi o reencontro com um dos marcos históricos da saúde mental brasileira, pois a C. S. Anchieta foi o primeiro hospital psiquiátrico a ser interditado no pais.

Resta-nos agora continuar a luta antimanicomial, buscando melhorias nos atendimentos dos CAPS e estarmos atentos a criação de novos hospitais, pois o modelo de atendimento opressor ainda parece pairar sobre a saúde do pais...